18 de maio de 2013

Estar pobre e triste às vezes é estar extremamente consciente

      Existe mais podre do que rico? Lógico que sim. Podre é a classe dominante. Existe mais felicidade do que tristeza? Lógico que não. Tristeza é o sentimento dominante. Algumas pessoas acham que sou triste. Que sou, então, mais um choram em meio aos fracassados. Só que quem pensa assim ainda não descobriu que eu olho sempre para mim; e por isso, fico sempre alerta para não errar em uma coisa: no julgamento. O Podre se preocupa muito em melhorar de vida. Em se tornar, assim, um rico, quem sabe. O Triste pensa, como pensa, em um dia viver alegremente. Passa horas à procura da felicidade, que proporcionalmente se aparenta distanciar. Ambos, Podre e Triste, quase não possuem tempo para pensar na vida dos outros, até por que se dedicam, quando querem, plenamente em melhorar a sua. O Pobre e o Triste sabem o que é ser julgado e com isso aprendem melhor a se julgar.


      No novo quintal onde moro existe uma família. Essa família é a proprietária do imóvel. Eu moro de aluguel na casa dos fundos, e minha parede divide meu quarto com a dessa família. Aliás, nem sei se é bem uma família. Pelas conversas que ouço através de seus gritos, posso entender que ali vive um velho, talvez o dono. Uma velha, provavelmente dona de alguma parcela da propriedade. Uma filha e uma neta. Todos brigam entre si. Em nível de guerra. E depois desta última noite, se eu achava que na minha casa vivia-se um inferno, aqui é algo pior. As discussões se desenvolvem facilmente e sempre por coisas fúteis. No decorrer do conflito — que às vezes o que está em cheque é algo insignificante como um copo que caiu no chão — começa-se a falar de acontecimentos passados e as lembranças trazem recordações de fatos que deveriam ser esquecidos. Os gritos, os berros. As coisas que caem ao chão, semana a semana. A neta que se desespera e se penetra na situação fazendo presença ao colocar seu pronto de vista: CHEGAAAAAA! CHEGAAAAAA!

      Tudo começa pela filha. Ela é a pessoa que mais se incomoda na casa, e se incomoda com tudo. Ela parece muito comigo, inclusive. Em todos os aspectos não. Apenas em um: no julgamento. Antes de parti da casa de meus pais, achava sempre estar certo. Julgava-me ter razão, e os outros, defeitos. Nossas brigas familiares, pelo menos, eram mais lúcidas. Havia mais conversa e em alguns momentos parávamos para buscar um saudável dialogo. Entretanto, nunca existiu acordo, nem contentamento. Era outra guerra. Deitado na cama do meu quarto e escutando todos os escândalos durante a madrugada, comecei a perceber o quando é difícil entender os defeitos dos outros enxergando os defeitos nossos. A filha se acha perfeita e por tanto, não aceita falhas. Ela não se acha triste. Acha, apenas, que os outros a fazem se sentir assim. Ela nunca vai tomar a atitude que tomei. Ela nunca vai encarar sua realidade, encarar a si mesma.

      Tenho muitos motivos para me entristecer com meu pai, porém, tenho muito mais para agradecer. Ele fez o que fez, e fez de tudo isso a sua parte. Cabe agora a eu fazer a minha. Sou Triste com isso. No fundo eu queria muito te dizer boa tarde! Isso, simplesmente boa tarde. Queria poder te ver todos os dias. E conversar sobre as coisas boas. Quero tanto ver nosso melhor, tanto. E para isso sei que em primeiro lugar devo te respeitar acima de qualquer coisa. Você jamais me verá agir de uma forma pela qual não seja compatível com seu interesse. Embora seja difícil saber o interesse das pessoas, eu sei mais ou menos me atuar. E nessa minha ação você poderá me achar frio, desmotivado ou triste quem sabe. Não dói se comunicar. Às vezes nada tem a ver com preocupação, mas "apenas carinho". Daí, de repente, também, eu fique muito extrovertido, e você normalmente pode dizer: está passando dos limites.

      Você pôde ver a minha outra face. Um dia acreditou que eu era misterioso, inteligente e interessante; depois, muito recentemente, teve certeza de ter se enganado ao ver completamente o oposto. Hoje, quem sabe, você esteja confusa. Sem saber quem eu sou. Ou quem sabe tenha se contentado, porque talvez você já tenha vivido isso e ao olhar para minha atitude viu uma fase da situação e comportamento que julga ser inerente a todo o ser humano. Ou seja, viu um menino, que demonstra ser pobre e triste. Pode ser que eu seja. Tem gente que acha. Mas já ouvi comentários contrários. Tem pessoas que não vê outro Guilherme se não o crítico literário.

      Meu pai acha que eu sou louco. Minha mãe acha que sou um artista. Minha irmã tem hora que me cópia; hora evita fazer tudo que faço. Vários tem certeza que sou alcoólatra e poucos, drogado. Alguns acham que trabalho, outros que estou desempregado. Que moro com meus pais ou que moro sozinho. Algumas meninas falam que sou romântico e delicado, outras, que sou arrogante e insensível. Eu um dia cansei e assim, me perguntei: quem sou eu que tanto faço de mim? E uma plateia parou para ouvir a resposta, que ainda está sendo respondida. As pessoas entram em nossas vidas para justificar quem nós somos. Eu jamais poderia dizer quem eu sou sem dizer o que para mim você foi, por exemplo. Você fez parte da minha história e eu fiz parte da sua. Boa ou ruim, uma história tem sempre um final verdadeiro.



Boa tarde. Simplesmente boa tarde!
São Paulo, dia 18 de maio de 2013