17 de janeiro de 2018

Novas Dimensões

     Os erros são doenças, como tumores, alguns inclusive incuráveis. Diante do erro deseja-se ou fugir ou reparar. Embora uma das opções sirva como livramento, o que se esquece é de como tudo começou. Impossível tratar uma doença sem saber a sua causa. Mesmo que não aja cura, é provável que aja aprendizado. As doenças são traumas da carne e dos afetos. São dores acumuladas por eras dentro do nosso próprio espaço corporal nas agruras do tempo da mente. 

     No amor é assim, seja ele correspondente ou correspondido, sofre quem mais desejou. No entanto, não é só a vontade de obter que nos destrói, mas também de não desejar coisa alguma. Quando somos muito jovens não percebemos muito isso, mas a experiência nos revela os perigos do que nossas aparências podem demonstrar. Às vezes não era amor que sentíamos e ainda mais improvável que fosse ódio. Nossas atitudes talvez eram as mais nobres e gentis, sem ambições, sem retorno em troca, sem interesses, com o simples olhar para o outro. Quando finalmente aprendemos a importância de agradar, queremos agradar a todo mundo. Quando finalmente reconhecemos o valor do bem querer, vamos em busca de tempos mortos na esperança de fazê-los reviver. Além da nossa cruz, querer carregar as dos outros. Criar pontes, fazer amizades, priorizar os afetos. 

     O amor então nasce sem cuidados e sem restrições, levanta voo sem direção e pelo jardim cresce até onde o sol não alcança mais. O amor transborda além do copo, por toda a casa e preenche todo ar. O amor liberta as amarras da dúvida e encanta o novo caminho nunca descoberto. Uma novela nova se inicia, escrita com as lições da dor e do desamparo, pois foi assim que se aprendeu. Demoramos a acreditar e a reconhecer que somos todos iguais ao querermos o mesmo descanso. Abraços e olhares sobrecarregam a própria estima e quando não se vê o amor já consumiu. Você irá dizer que só quis ajudar, que só quis resolver e não percebeu como tudo começou. Não são todas as pessoas que precisam de ajuda, algumas não querem, outras não merecem e haverá as que não somos capazes de se quer estender a mão. Faremos alguém se apaixonar indevidamente. Faremos alguém nos desejar como última saída. Faremos alguém acreditar que seremos o único futuro. Seremos os enviados por Deus e na verdade de Deus não teremos nem mesmo o reconhecimento por tentar fazer nossa parte. Não somos nós quem sabemos exatamente o que fazer. As necessidades estão nas pessoas. Praticamente quase nada temos a oferecer, senão nossa capacidade de se adaptar e interagir. Essas são nossas escolhas. 

      Dizer não também é se adaptar, dizer não também é se interagir, dizer não também é salvação. Quando descobrimos a importância de se colocar no lugar do outro, descobrimos até onde vão nossos limites na própria relação. É quando nem todas mais são belas, nem todas mais são gostosas, nem todas mais são atraentes. Não iremos mais querer tantos amigos, porque nem todos são tolerantes, nem todos terão sensatez, nem todos serão o que são e nem todos irão de fato querer nossa amizade. Só podemos ajudar quem pede a nossa ajuda. A próxima etapa será ser seletivo e numa outra oportunidade, ou quem sabe numa nova dimensão, poder a todos fazer o bem sem olhar a quem.  


9 de janeiro de 2018

Néctar

         O relógio de pulso virou armadilha. As horas dinâmicas na tela despertam enormes anseios. O mel do pote tem secado virando pó o doce da felicidade. Não se sabe ao certo o que se quer. O tempo passa e junto às histórias e mentiras haverá mais frustrações, porém, novas experiências e oportunidades de recomeçar. Descobre-se sempre novas posições, novos momentos e quentes palavras. Já não importa tanto a verdade. Já não importa tanto as promessas. Esperança virou medo. Medo virou prazer. Prazer virou rotina. E a rotina vai envelhecendo a alma do rosto. Engraçado perceber que o que antes era motivo de morte, hoje é de excitação. Quando a traição vira fetiche e as rugas no espelho tapam nossa boca, puxam nossos cabelos e nos permitem sermos chamados de Delicia. É duro ser mal julgado e só ter sonhos como justificativa. Os impulsos da carne são comuns entre homens e mulheres, só que ninguém os respeitam, ninguém os admitem, mas hipocritamente os banalizam. Descrimina o que se pratica. Julga o que se deseja. Confuso os pensamentos se saem, e demais se é maltratada por desejar amar e ser amada como única opção. Obrigada a se calar quando a vontade era de falar o que o coração sentia. Sorri docemente, quando a vontade era dar uma pancada na cabeça de algum infiel. Preparar aquele jantarzinho especial, enquanto o fofo assiste à televisão, com um copo de cerveja nas mãos, quando a vontade seria de colocar um vestido bonito e jantar em algum lugar charmoso. É proibido falar em cansaço depois de um dia exaustivo. É proibido queixar-se de algo que não tenha ocorrido bem. É proibido revelar os ciúmes quando o sujeito demonstra claramente que ela não é quem pensa ser na vida dele, ou seja, a única. É proibido, também, dizer “não, hoje não estou a fim”. É proibido telefonar para saber como ele está: interpretamos isso como perseguição ou tentativa de controlar-nos. Enfim, é um crime não ser uma deusa e ter sentimentos imperfeitos. Somente a eles pode ser dado o direito da imperfeição. E assim, como ser feliz? Onde encontrar o néctar da paz em ser amada e plenamente desejada? Indo sem medo. Se entregando com fé. Nunca desistindo porque ser desejada é melhor que ser sozinha. Incansavelmente descartar e recomeçar são melhores que insistir e não morrer. Mesmo que a fama cresça, mas a esperança não diminua. É a necessidade de ser procurada que explica todos os defeitos. Não importa mais o que falam, o choro hidrata, cicatriza e rejuvenesce o triste e profundo olhar. Entre o tesão e o nojo, mais descobertas. Entre as descobertas mais oportunidades. Entre as revelações muita dor e prazer. Maquiagem para disfarçar as marcas da guerra contra o tempo. Entre o amor e o ódio, é melhor tentar de tudo a se entregar para solidão.