27 de abril de 2018

A Alma e o Sexo

          De várias maneiras poderia iniciar minhas palavras acerca deste título. De diversas maneiras a alma se uni a outra no holocausto da paixão. Quando o prazer se troca ou se iguala, a alma sente a diferença, a alma muda, se transforma, evolui, mas quando não combina, cai como de um abismo na ilusão do que não era amor para os românticos ou tentação para os devassos. Quando não há afetos maiores que os desejos. Quando os desejos não são piores que os afetos. Quando o prazer se torna tudo, até motivo de continuar ou de se arrepender. Quando o prazer é objeto e poderá salvar ou arruinar a união. Então os fetiches decoram as exigências, fantasiando promessas de um futuro melhor. Nos entregamos e nos permitimos. Algumas coisas que são novidades se tornam hábitos e outras ocupações, muitas delas só para agradar ou ser agradado. Submissão, mas não amor, e o respeito é só em público. O respeito é só por negação e esconderijo. O respeito é apenas não assumir a falcatrua e rejeitar toda verdade e sacanagem. Ninguém quer vestir a camisa dos prazeres da carne por uma razão muito cristã e muito hipócrita até então. Mas ninguém quer. Servirá só para dormir e para enxugar as lágrimas talvez de tanto desgosto. Um sempre sofrerá mais que o outro quando existe alma e sexo. Mas quando só existe isso e isso por si só é o que se uni e se move, sem a supervisão e o cuidado do coração mas apenas vontades reprimidas, o prazer além de prazer se torna pranto. As noites se tornam dias. As explicações e exigências acumulam e transbordam as expectativas do que seria bom. A alma sente cada pedaço e cada desatino da traição. A alma sente cada mentira e cada exagero à satisfação de um outro ego. Não se pode perder a criatividade e nem a transparência por ele. Não dá para ficar calado ou gemer em silêncio já que quer ouvir e se tranquilizar. A intimidade vira ruínas como os cabelos desajeitados plena madrugada, e o amigo querido deitado na cama bêbado sem ouvir os desabafos da alma estilhaçada pela falta de independência é o protagonista da alucinação. A noite que era para ser uma noite feliz foi desvinculada e dela cobrada os feitos mais absurdos e eróticos de uma imaginação sádica, enredo da beleza de uma obra pornográfica que para prevenção ou sorte da alma o sexo não aconteceu, as imagens não foram capturadas e nem as vozes ouvidas. Um não sentiu o alívio da tensão e o outro lutou para proteger os seus próprios afetos forçados também a própria corrupção. Pois entre a alma e o sexo, quando não há a leveza do carinho há a vingança do prazer. Existem várias formas de não sofrer, uma delas é transformando o outro em objeto para alma não sentir e só o sexo permanecer como poço ou refúgio, um para quem ainda tem alma e o outro para quem praticamente a perdeu de tanto a esconder.