Sei que não morro sozinho.
Durante o caminho, atrás de mim, têm se formado um lindo e infinito cemitério colorido, emudecido pelo triste silêncio do destino, vai abafando o frenético barulho da criançada. A infância é breve e acordamos todos os dias com essa maldita percepção, que nos resgata amargos resquícios do passado. Atrofia nossos sentidos em um mundo de conclusões obvias. Um mundo que me dá arrepios, cheio de silêncio e mistério. Ultimamente às aves têm se recusado a cantar. A temperatura cai-se abruptamente, como se Deus estivesse atônito. Ninguém se atreve a falar alto, ou por vergonha, ou por tristeza ou medo por mais certo. Isso sem contar que sempre surgi um cheiro de carne podre atrás de mim. Não quero olhar para trás e ver enterrarem os corpos um por um, todos os dias, a todo o momento, em vários lugares. Ninguém presta atenção, mas os olhos dos mortos sempre estão fechados como se esperassem permissão para abrir de novo. Fico pensando: ainda estariam sonhando com sorvetes e pirulitos? Suas casas e carros? Bolo de aniversário, mesmo que sem nem um futuro além da mesma tarde? Suspeito que dariam tudo por mais uma chance. Ou sua inocência é levada com suas vidas, depois do enterro na terra fria? Esses destinos parecem cruéis demais até mesmo para permissão de Deus. Ou as crianças trágicas nascem de novo quando o mundo não está olhando? Eu quero muito acreditar em uma verdade além da nossa, escondida, oculta de todos, mas menos dos olhos mais sensíveis. Na procissão sem fim de almas, que não podem e não serão destruídas. Eu quero muito acreditar que apenas não estamos conscientes da eterna recompensa e da tristeza de Deus. Que não podemos ver sua verdade: de que o que nasce ainda vive e não pode ser enterrado na terra fria, mas apenas espera o comando de Deus para renascer e sempre. Onde na antiga luz estelar ficamos em repouso e o nosso corpo, puro como de uma criança, no gramado dourado padece.