É incrível.
Porque o que a gente mais quer é saber o que o outro está pensando. Como eu adoraria saber o que o meu pai pensa de mim. Família é o lugar de traumas. De casos inexplicáveis. De situações quem dera infantis. Aliás, como saber quando alguém da família está sendo infantil? A fala dos pais são falas que representam a maturidade? Quanto aos netos, infantis, imaturos? Onde fica a prerrogativa de um adulto? No seu conhecimento? Na sua verdade? É pela família que podemos nos comparar? Acertar nossas próprias indiferenças? ... Uma vez..., depois de uma briga com meu pai, pessoas da família me disseram que o desejo dele era que no seu funeral eu não estivesse presente. Quando ouvi isso me senti bem em dar risada, não por saber que na data fúnebre como aquela minha presença seria rejeitada, mas que por esta família concluir que ainda sou uma criança. Minha inocência é se emocionar com o pouco. Nenhuma criança no mundo raciocinaria negar condolências póstumas, ou sim, talvez, como dizer que não te quero nem depois de morto. ¬¬ A morte não pede perdão, a morte pede respeito. Que diferença faria se depois de morto eu o contemplasse, em tristes considerações pelos seus feitos. Isso eu faço agora. Com muito prazer. Meu pai é tão maduro que está quase se retrocedendo. Quem bom seria se ele soubesse o quanto é importante passar dentro de casa importunando e incomodando como um bom vivam. O meu pai faz guerra gratuita com todo mundo. Ele é um carente da miséria por atenção; coitado! Em família, lá em casa, cada um ensina, ao seu modo, o que é amor, sem deixar de amar por perder a paciência. O meu pai, coitado, não tem mais paciência. Perdeu a criatividade. Claro, muitas vezes a gente quer ser independente. A gente quer ser autônomo. A gente quer não precisar. MANO! VAI TOMAR NO CU PARA ESSA GENTE! Isso é conversa fiada. Todos nós precisamos depender do outro. Ele mesmo, inclusive. Se fosse assim, se fosse tudo isso, com seu sucesso, poderia ter construído outra vida quem sabe melhor. Uma família diferente. Uma mulher diferente. Fazer filhos diferente. MAS NÃO! É por isso que eu digo que família é o único lugar que você pode deixar de ser mas continuará sendo do mesmo jeito. Quanto seria bom se meu pai me perguntasse, como já perguntei inúmeras vez: o que está pesando? Em? Todas as vezes que faço isso, sei que seu pensamento eu o destruo. Por que ele vem cheio de gagueira me falar do seu passado deprimente: coisa de quem não tem criatividade. ¬¬ O meu pai é muito ignorante. Não tem celular. Não sabe usar. Não faz questão. Não gosta de fotos. Não sabe imprimir. Tem dificuldade para ler. Nunca vai perceber que é só importunando que se descobre se o outro ama. Quer descobrir? Seja rabugento. Irrite. Fale o tempo todo. Provoque! Diga que ama. Não tenha medo. Se lance na coragem de incomodar. De infortunar. Ligue uma vez. Ligue duas vezes. Ligue o dia todo e depois disso pergunte o que está pensando. Esse é o maior teste de aprovação ao seu amor. Quem não passar aposto o que quiser que foi por que te achou infantil. O ser humano é assim, troca as palavras, troca os sentidos, e a confusão começa sempre na família. Repare que as pessoas mais complexas em suas convicções foram criadas por famílias tradicionais. A família contemporânea pede improviso. Não existe mais essa coisa de Pai, Mãe, Filhos, Reuniões, Recompensas e Castigos. Hoje, todos estão conectados e não há mais graça nem temor em ver um pai babaca ditando regras. Só gera discórdia. Só gera solidão. Lá em casa o meu pai se sente sozinho o tempo todo. Ele briga, ele xinga, mas ninguém se importa. São sempre as mesmas reclamações inúteis. Não muda. Não melhora. Não aprende. Coisa de pensamento tradicional. Coisa de quem vive resmungando que gostaria de silêncio. Quanta ignorância. O silêncio é ouvir a voz de quem tu ama. O silencio é a música que tu gosta. O silencio é para ser aconchegante. Povoado. O silêncio não é falta de som. O silêncio é o som que combina com nosso sangue. Das vezes que meu pai saiu de casa, não demorou muito tempo para voltar todo contente e reconfesso das nossas risadas. Acho que ele nunca sentiu tanta falta de ouvir nossas vozes. Meu pai acha que lá em casa todos o odeiam. Que idiota. ¬¬ Isso é óbvio! Logico é todos odiarem o pai. Ninguém gosta de pai. Que bom não gostar de pai. Até porque pai não foi feito para ser tratado como se trata a mãe. Pai não é confessatório. Pai não é reservatório de afetos. Pai não é depósito de emoção. Quem sabe um dia... Mas ele não. Nunca será, controlando o seu amor, nem até depois da morte. Que imbecil. Que bom seria se ele tivesse deixado meus irmãos e eu se juntarmos e montar um complô contra ele. Que bom seria se ele apenas nos observasse falar mal. Mas ele não saia. Fez questão de apartar nossas fofocas. Nossos desaforos. Nossos cochichos. Nossa conspiração de querer atacá-lo pelas costas. Ele nunca nos deixou se defender do seu rude amor. Nunca permitiu nossa oposição. Até depois de morto quer fazer isto. Limitar com seu ressentimento excessivo. Sufocante. Agressivo. De controlar o que estamos fazendo. Como estamos comendo. Que programa estamos assistindo. Meu pai já está morto no tempo. Seu luto já foi sendo curtido a anos como um grande constrangimento. Só iremos superar quando ele finalmente renascer desse velório. Sobre esse dia quase fui proibido de entrar, se é que ainda não serei. Será mais uma prova de que nada irá mudar. Que bom seria se meu pai soubesse o que estou pensando. Que bom seria se ele pudesse ler isso, mas infelizmente defunto não acessa facebook.