Impossível prever o que virá, controlar o que se vem; suportar o que já veio, esquecer o que se foi. Vinga-se com cuspe forte no chão ou sujando imprudentemente a via de rua.
Faça o que for melhor que adoce o seu desgosto. Faça o que for melhor que umedeça a sua tragédia. Mas as palavras estarão prontas quando não quiser fazer nada. Na falta de opção a poesia poderá ser uma. Na falta de opção a música poderá ser uma. Na falta de opção pedir desculpas poderá ser uma. Na falta de opção voltar a trás é ter uma. Só não diga que não tem opção.
Quem lhe amou esteve pronto para secar suas lagrimas ou limpar a sua demência no canto da boca. Quem lhe amou esteve pronto para capturar os passarinhos destreinados do seu estomago ferido. Não tenha medo de chorar no copo das mãos de quem um dia lhe acariciou. Não tenha medo de mostrar a alegria de sua tristeza. Não seja covarde em dizer não não há opção: gritar no vazio ainda é gritar.
A infelicidade de um casamento destruído, de um namoro encerrado, de um emprego perdido. E nada muda, apesar da prisão, e nada muda, apensar dos lamentos, e nada muda, a mesma comida, o mesmo trajeto.
Você dorme e nada muda porque os filhos ainda estão pequenos. Você dorme e nada muda porque agora os filhos estão crescidos. Você dorme e nada muda porque os filhos agora vão se casar e você dorme e durante o sono se esquece, mas nada muda porque ao acordar a ferroada arde, você perceber algo, como ter vivido à toa.
A preocupação de se desperdiçar mais um dia de esperança e se ver sem opção. E o corpo lembra uma janela suja que todo o dia quer se animar em limpar, mas não limpa. Obscurece a luz que vem de dentro, a cor cinza aumenta, a vontade de levantar diminui. O cheiro do desinfetante é o cheiro do vômito que não curou a dor de barriga. É a vontade de ir ao banheiro com a cabeça pensando em diversos problemas. É deitar na cama velha depois do banho tomada, o som antigo dos rangidos lembra que nada mudou. Os buracos do chão se estendem como mapas da sua historia. As lascas do armário velho traçam as rusgas finas em seu novo rosto. Se limpa as gavetas para apagar vestígios da sua inexistência.
Quando é impossível confiar em mais alguém. Quando é impossível acreditar mais em você. Quando se calar para não brigar. Quando concordar com a família para encerrar logo o assunto. Você ainda tem opção. Sorrir ou ficar serio. Ler ou aguardar a morte. Ignorar ou tentar ser gentil. Lembrar dos outros ou pensar só em você. Viajar ou pular nas nuvens. Deitar ou correr no mar.
Sobrevivo mendigando o amor.
Pedir esmola ainda é uma opção.