Quando olho para o céu lembro das minhas amizades de infância. Todos os finais das aulas de educação física eu me deitava exausto na quadra e olhava para o céu. Sempre que saia de bicicleta com meus amigos para os parques, ao chegar exausto, deitava no gramado e olhava para o céu. Finais de semana quando encontrava meus amigos para conversar na praça deitava-me tranquilo e olhava para o céu. Quando brincávamos na vila de casa, costumava me jogar no chão da rua e paralisado olhar para o céu. A minha vida e a vida dos meus amigos mudaram, mas o céu continua idêntico aquela época. Mas o céu não é apenas saudade, o céu não é apenas lembrança, o céu também é aprendizado. Engraçado que hoje sempre quando me jogo no chão e olho para lá vejo tudo escuro. Quando estou entre amigos e olho para cima é sempre noite, sem nenhuma estrela. Sempre tarde, sempre rápido, sempre arriscado. Sempre perto do fim. Sempre quase na hora de voltar. Sempre afobado pela urgência de alguém. Sempre próximo da presa de dormir.
Esses dias estava jogando futebol a noite com alguns amigos do trabalho e um deles me desafiou. Um garotinho desconhecido me provocou em jogo e estressado eu o apavorei. Esse amigo repreendeu-me dizendo que só gritava com jogadores mais novos. Respondi que gritaria com qualquer um, que me alteraria independente do tamanho. Quis dizer a ele que não era pela idade, mas sim pela ofensa. Quis dizer a ele que na condição de meu amigo muito lhe faltava para me compreender. Falar em dar exemplo é fácil para quem já está com a vida ganha. Quis dizer a ele que não era certo como meu amigo me subestimar. O clima do jogo ficou péssimo, tanto que nem bebemos cerveja juntos nesse dia que era tradição depois dos jogos. Fui para casa olhando para o céu. Admito que agi errado em relação a superioridade que impus ao menor mais vulnerável. Mas a questão ultrapassou o que entendemos como respeito, o que entendemos como consideração, o que entendemos como ser importante, ser querido, isso já era superado muito antes do desentendimento. Já não se importava muito com a relação amigável e o grito com o garoto foi apenas um pretexto, uma gota que transbordou o copo. Depois de uma semana fui procurado. Fui questionado porquê do sumiço. Disseram até que sem mim aquele futebol não teria mais futuro. Refleti muito sobre o valor que deveria dar por tudo o que estava acontecendo, ponderar para que qualquer atitude minha não se saísse como ingratidão. O que me restou foi olhar para cima e me orgulhar por continuar menino. O menino desesperado que não espera o outro dia para se desculpar. Que chama todos os mais velhos de senhor. Que amigo não é só a noite, mas o dia todo. O menino que até hoje não sabe o que significa política. Que acorda cedo, bate na porta e chama para brincar. Deveríamos continuar por toda a vida aquela criança que não só era carente, mas que se imaginava voando com seus melhores amigos.